segunda-feira, 16 de novembro de 2009

O espetáculo da imprensa

A relação médico-paciente sempre foi rodeada de complexidade na atuação ética do médico. O caso do especialista em reprodução humana Roger Abdelmassih, toca profundamente nesta questão. O fato foi amplamente divulgado pela imprensa e muitos veículos já tomaram a decisão final: o médico é culpado. O Ministério Público acusou Abdelmassih e a justiça acatou denúncias de crimes sexuais, manipulação genética e evasão fiscal, o que o levou à prisão e também acarretou a suspensão temporária de seu registro profissional pelo Cremesp. As tentativas de hábeas corpus foram negadas pelo Tribunal de Justiça e pelo Superior Tribunal de Justiça. Alguns pontos precisam ser ressaltados nesta história: a primeira denunciante foi uma ex-funcionária demitida; a maioria dos alegados ilícitos ocorreu ainda na década de 1970 e só agora vão se somando mulheres a serem ouvidas pela polícia para instrução do devido inquérito criminal. Haveria uma conspiração para obter condenações no CRM e na Justiça criminal para a obtenção de indenizações? Ou Roger Abdelmassih cometeu os crimes e é culpado? Estas respostas só podem ser dadas em um Tribunal e o sistema Judiciário brasileiro respeita uma premissa básica: todo cidadão é inocente até que se prove o contrário. Essa é uma garantia fundamental do Estado de Direito, sem a qual todo e qualquer cidadão está sujeito à arbitrariedade. O comportamento de boa parte da imprensa não respeita essa premissa. Algumas revistas de grande circulação, blogs, jornais e outros veículos condenaram Roger Abdelmassih. De outro lado poucos o defendem ardorosamente. O papel correto da mídia neste caso é manter-se imparcial como preza o bom jornalismo, ouvindo todos os envolvidos.

A imprensa deveria tratá-lo como réu, não como condenado. O lugar de seu julgamento é um tribunal, não a praça pública. É preocupante perceber que nossa liberdade individual e dignidade podem ser confiscadas por quem deveria salvaguardá-las. A mídia tem o papel de informar e não de polemizar e criar dúvidas. Alguns veículos alimentaram o espetáculo e espremeram o assunto até a pauta começar a esfriar. Surge um furor coletivo pela punição médico que foi transformado em monstro. Analisando o caso de Abdelmassih, muitos chegaram a lembrar o caso da Escola Base. Em 1994, donos e funcionários foram acusados de estuprar alunos. Os envolvidos tiveram suas vidas destruídas. A escola foi depredada e fechada. Um programa de TV pediu pena de morte aos "pedófilos". Anos depois, a investigação foi concluída e o casal foi inocentado. Não havia evidência do crime, mas era tarde. O dano já havia sido feito. Hoje a história pode se repetir com o médico Roger Abdelmassih. As dificuldades que os jornalistas enfrentam para cobrir o caso não justificam de maneira nenhuma nem a defesa, nem a demonização do médico. Os jornalistas não têm acesso aos autos do processo, pois o mesmo corre em segredo. Outro ponto que deve ficar claro é que o médico se recusou a dar entrevistas e somente concedeu a palavra a uma revista. O caso de Abdelmassih é difícil e deveria ter sido tratado com muita cautela. O final dessa história deve ensinar mais uma grande lição a imprensa. Se for comprovada a inocência do médico, danos irreparáveis terão sido cometidos e será praticamente impossível reparar a situação da imagem de Roger. Ao contrário, se a condenação do médico em última instância for confirmada, e Abdelmassih for considerado culpado, boa parte da mídia irá respirar fundo, aliviada de um grande constrangimento, mas sua atuação no caso já terá sido desastrada. Uma coisa é certa: A sorte está lançada e não deve cair no esquecimento. A nós, leitores, ouvintes e telespectadores, resta ao menos uma constatação: inocente ou não, Roger Abdelmassih vai sair com sua imagem manchada, e sem dúvida com muitos prejuízos.

Fontes:

Folha de São Paulo
Observatório da Imprensa
Revista Veja


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3 comentários:

Humberto Camargo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Humberto Camargo disse...

Como diria a Dama de Copas, corten-lhe a cabeça!

Anna Baccarat. disse...

Aiin, se a fátima bernardes tivesse sofrido isso, no lugar das outras esse medico pacato...ia estar ''(ferrado)''