quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Relato de um morador de rua

Para quem não conhece, o fim de tarde no centro de São Paulo é sempre o mesmo. É só os comerciantes fecharem as portas e os viciados em drogas - também chamados de noias aparecem - para começar as sessões incessantes de uso de crack. Os usuários viraram os donos da rua. Dezenas de pessoas, inclusive crianças e adolescentes, circulam em bandos. O lugar que é conhecido como cracolândia não tem mais um lugar fixo no bairro da Luz. Muda de endereço quase todas as noites, e lá as pessoas consomem, vendem crack, uma droga barata e letal, sem serem incomodados. Em 2005, a prefeitura anunciou um ambicioso plano de revitalização da área e chegou a decretar, no ano passado, o fim da cracolândia. O projeto Nova Luz, prevê uma série de ações para recuperar os imóveis abandonados e a segurança da região. O objetivo é conceder incentivos fiscais para atrair comerciantes. Por enquanto a única nova luz que se vê no centro é a do isqueiro acendendo uma nova pedra. A verdade é que esse é um problema social grave e não apenas da polícia, porém o tráfico deve ser combatido e reprimido. Tudo muito velho e que as pessoas estão cansadas de saber há 15 anos, porém outra “nova luz” se acendeu no fim do túnel. A principal novidade do plano desenhado pela prefeitura e governo do estado, para tentar diminuir a incidência do uso de drogas na cracolândia é o encaminhamento dos viciados para centros de tratamento psiquiátrico, com a oferta de leitos nos hospitais, enquanto se aumenta a fiscalização policial. Isso significa realizar acertos com entidades ligadas ao sistema de saúde e assistência social, com a Vara da Infância e com os conselhos tutelares. Além do atendimento médico, o plano prevê a construção de uma rede para oferecer ao dependente de drogas uma porta de saída. Isso implicaria garantir a ele uma renda mínima, o acesso a cursos profissionalizantes, o primeiro emprego, sessões de psicoterapia, escola em tempo integral e oficinas culturais e esportivas.

A ideia do bolsa-anti-droga é muito boa e tenta achar uma resposta para a difícil questão, mas os hospitais que recebem dependentes não têm condições de mantê-los por muito tempo e o tratamento não funciona a curto prazo. Além disso, muitos deles não querem sair das ruas e são verdadeiros "escravos" da droga. O usúario não aceita ser internado, dormir em albergues - porque são todos "zumbis" – e muito menos qualquer tipo de ajuda que vá tirá-los de seu reduto. Um levantamento da Prefeitura indica que de cada quatro moradores de rua, apenas um aceita a oferta de dormir num albergue. No último fim de semana eu passei pela região da cracolândia, rumo ao ponto de ônibus. Eram quase 8 da noite e o movimento de noias já era grande. Me afastei de ruas onde estavam reunidos e fiquei esperando o coletivo sozinho, porém a poucos metros de distância um morador de rua conversava com agentes da Central de Atendimento Permanente e Emergência da prefeitura. Observei de longe que o homem recusava a ajuda oferecida pelos agentes. Pouco tempo depois eles desistiram e foram embora. Me senti curioso naquela situação e resolvi conversar com o morador de rua. Me apresentei a ele como estudante e como estava com meu amigo de todas as horas - o gravador de áudio - no bolso pedi a ele para gravar a entrevista. Paulo Roberto Alves da Silva, 50, se mostrou um pouco fechado no início com minhas perguntas, mas acabou respondendo a tudo com muita tranqüilidade em uma conversa simples e rápida. Ao lado de seus dois cahorros, Natureza e Sol, ele mora a cinco anos nas ruas do centro, e é completamente revoltado com a sociedade. Paulo não aceita ir para albergues nem nos dias mais frios, reclama da abordagem da polícia e lamenta seu vício no crack. Acompanhe a entrevista abaixo com o relato de um morador de rua.

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3 comentários:

Unknown disse...

Só não fui assaltado uma vez na famosa cracolândia porque dei sorte! Naquela região tem que ficar esperto ao falar no celular com a quantidade de "mãos leves" e noias. Não vejo como arrumar aquilo lá. Se tirar dali, os caras arrumaram outro lugar e a patifaria permanecerá!!

Unknown disse...

Bem legal a entrevista! Vc foi corajoso de abordar um viciado. Acho que o Kassab quer "maquiar" a cracolândia de um jeito que a região perca o titulo de cracolândia, mas assim não funciona. Aquilo lá continuará e permanecerá por mto tempo!!

Alicia Marques disse...

A cracolândia é um assunto polêmico e sem uma aparente solução. A nova Luz do Kassab e do governo do estado são frageis e não resolverão o problema social.

(2) ótima entrevista
bjs